terça-feira, 3 de setembro de 2013

Duelo de um só


A paixão em sua vã loucura
Solta no mundo, enjaulada em si:
Arde, cresta, queima!
Sem sucumbir, sucumbi.

Ai da noite: vou alcança-la!
Ai da noite: vou devorá-la!
Negra noite maior que eu!
Negra noite que me ignora!

E a noite a vê e entende,
E não pode a noite alcançá-la,
E não pode a noite acalmá-la,
E não pode mudá-la, a noite...

A noite só pode ser noite!
E contempla a paixão que se debate e ruge
Trancafiada em si,
Surda, ensurdecedora...
- Emudecedora! Engasgada...

Se abrisse os olhos sinceros seria uma com a noite,
Uma com o Infinito.
Seria amiga de si.
Estela de Menezes (Junho ou julho de 2013)

segunda-feira, 18 de março de 2013

O Homem



O homem que acabou de servir no inferno,
Mês passado
Trancafiou-se numa cela de prisão.
Para proteger-se da liberdade.

Usa roupas rasgadas
Para mostrar que não lhe serve mais esse mundo,
Mas todos pensam que é por que ele não tem parafusos.

Come numa pequena bacia de alumínio amassada e encardida
Por que não tem sabor sua comida,
Mas todos pensam que é por que ele é pobre

Não sabem que ele não é nem rico nem pobre,
Nem “de mente sã” nem demente.
É vazio
E vive no escuro por medo do que a luz lhe possa mostrar

...

Escrevo por que do inferno, da prisão, das roupas rasgadas, da vasilha amassada...

(Escrever talvez seja uma forma de tatear a luz pensando que não haja nisso perigo de encontrá-la).
Não sei se escrevo por que do vazio, mas por que da liberdade, da liberdade sim!

Mas estávamos falando do homem.
O homem escreve por que (acha que) não sabe voar.
Mas de que valeria voar
Se não soubesse (será que sabe?)
Entrar em comunhão com outras almas.
Ele fala em voar, voar mesmo! Mergulhar
Em todos os mundos e ser um com eles.
(Se não soubesse não saberia voar).

O homem marcha no inferno de sua prisão,
 No inferno de suas roupas sem sabor,
No inferno de sua tigela de parafusos.

(como se não soubesse)
 Vive no escuro de todas as almas
(No mergulho, na luz sem liberdade, na comunhão sem sabor)
- em todos os mundos.
 E escreve vazio: -V-O-A-R-

( Estela de Menezes, 11/03/2013)

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Um Delírio (Mais Um Delírio)

Eu venho de outro tempo
Pro qual não posso voltar,
Mas que também nunca se ausenta
Nem de mim, nem de nada.
E esse tempo é tantos tempos...
E sou milhares taravés do tempo/tempos,
Onde tudo está sem estar,
É e não é. E por isso é.
Um tempo que quase ninguém vê
Nem em mim, nem aqui , nem em si...
Apenas o vê quem eu vim encontrar
E que me encontrou.
Eu sou todas as coisas e nenhuma.
A imensidão, a imensidão plena.
O sono e a vida - o êxtase.
Sou o Universo imerso no Universo imerso em mim.
Somos todos a plenitude brincando de ser fragmento,
De ter peso, limite, moral, intelecto,
- medo e miséria-riqueza.
Somos menininhos brincando
De estar na prisão lutando por liberdade
Sem saber se de fatos elas (prisões e liberdade) existem,
Sem saber, em sua inocência, o que de fato elas são.
Somos soldadinhos comandados por nossos delírios:
Nossos delírios- comandos,
Nossos delírios- medos,
Nossos delírios-moral ( e anti-moral-moral),
Nossos delírios verdades incutidas,
Nossos delírios desejos prémoldados,
Nossos delírios sanidade/insanidade
( aos moldes do que é certo).
Somos soldadinhos meninos
Comandados pelo delirante que gritou mais alto
E que em nosso atordoamento gritamos: AMÉM!
Somos soldadinhos meninos
Comandados pelo delirante que
Pareceu mais justo a nossos pais,
Que pareceu mais correto a nossos avós,
Que pareceu mais austero a nossos bisavós,
Que pareceu mais poderoso a nossos tataravós-
Que pareceu mais selvagem a nossos ancestrais milenares.
Passamos o poder a quem nos parece mais capaz,
A quem nossos herdados e sagrados valores sociais ditam ser mais capaz, ser o comandante nato!
E nos anulamos...
E escravizamos, submetendo-nos a nossa crença projetada no capaz comandante,
Nossas mentes, nossos corpos, nossas vidas,
Nossa desconhecida capacidade ou incapacidade
Por que quem não cumprir a lei e o “consenso social”: " tá fazendo coisa feia, meu bem!"
Seguimos ao que pareceu, a qualquer um
E a todos nós, mais protetor
( guiados pela "verdade mais protetora” ou pela preguiça, ou nosso eterno desnorteamento nascido do conflito entre as verdades ditas e as que abafamos em nós)
E o nosso sábio comandante
Era só mais um menininho com medo ou loucura
Por que todos são menininhos com medo ou loucura
Enquanto não são o Universo imerso no
Universo imerso em nós - o que somos.

Estela de Menezes, 10/02/2012