O homem que acabou de servir no inferno,
Mês passado
Trancafiou-se numa cela de prisão.
Para proteger-se da liberdade.
Usa roupas rasgadas
Para mostrar que não lhe serve mais esse mundo,
Mas todos pensam que é por que ele não tem parafusos.
Come numa pequena bacia de alumínio amassada e encardida
Por que não tem sabor sua comida,
Mas todos pensam que é por que ele é pobre
Não sabem que ele não é nem rico nem pobre,
Nem “de mente sã” nem demente.
É vazio
E vive no escuro por medo do que a luz lhe possa mostrar
...
Escrevo por que do inferno, da prisão, das roupas rasgadas,
da vasilha amassada...
(Escrever talvez seja uma forma de tatear a luz pensando que
não haja nisso perigo de encontrá-la).
Não sei se escrevo por que do vazio, mas por que da
liberdade, da liberdade sim!
Mas estávamos falando do homem.
O homem escreve por que (acha que) não sabe voar.
Mas de que valeria voar
Se não soubesse (será que sabe?)
Entrar em comunhão com outras almas.
Ele fala em voar, voar mesmo! Mergulhar
Em todos os mundos e ser um com eles.
(Se não soubesse não saberia voar).
O homem marcha no inferno de sua prisão,
No inferno de suas
roupas sem sabor,
No inferno de sua tigela de parafusos.
(como se não soubesse)
Vive no escuro de
todas as almas
(No mergulho, na luz sem liberdade, na comunhão sem sabor)
- em todos os mundos.
E escreve vazio:
-V-O-A-R-
( Estela de Menezes, 11/03/2013)