terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Pressentimento


“ Ao menos escrevem-se versos”*
Alguém escreve versos, certo.
Eu não escrevo nada.
Não desenho, não durmo...
Não expresso nada.
Não sei de nada, não expresso o que não sei
Sei que no fundo tudo é nada,
Sei que o que existe é o nada,
Mas não sei expressar, não posso...
E tem tanta coisa lá!...
Não expresso nada porque não sei de nada,
Nunca se sabe de nada porque não há nada pra se saber
Não expresso o que não sei,
 O que não sei se quero saber.
O que me tortura não saber.
O que me tortura vir a saber.
Saber... Nada!
No fundo tudo é nada.
Talvez seja isso que me tortura...
Não durmo...

Mil aranhas estiveram ontem em meu quarto.
Podem todos os oráculos não me dizerem o que de fato há,
 A movimentação oculta
Que virá definir minha vida nos próximos dias e meses
E talvez a própria vida...
Mas as aranhas...
Elas tem artimanhas poderosas demais, não mentem,
Não precisam mentir...
Elas eram muitas, umas magras, ágeis, astutas,
Outras eram fortes, negras enormes,
Senhoras de si, da indiferença, da crueldade,
Da hipocrisia e da covardia.
E a  última era  vermelha e cheia de veneno,
Nós a matamos, eu e ele,
Meu calçado rompeu sua teia cortante e perigosa
E destruímos sua bolsa de veneno separando-a do resto do corpo.
Suas patas esperneavam mesmo assim,
Ainda em sua loucura sem corpo,
Como se ela não soubesse que não tinha mais veneno,
Como se o veneno fosse sua vida!
E era pelo que vimos ali...
Não sei o que está acontecendo,
Não sei se algo está acontecendo,
Mas as aranhas nunca mentem!
Ah! Confiar em aranhas!...
O que está acontecendo?! Nada, talvez...
Mas talvez nada em movimento e isso é tanto...!
E hoje a dor foi clara.
Uma clara ilusão,- quem sabe? Tomara.
Tomara...
Mas não me venham dizer verdades, nem mentiras.
Nem tolices, nem sábios discursos, palavras...
Venha ele,
Apenas ele e me mostre a vida num beijo.
Venha o céu
E me deixem voar.
Amanhã... amanhã é outro dia!
Eu cumpro, amanhã, meu dever inútil
De vestir o uniforme/máscara de quem faz coisas
(não sei pra que, nem pra quem), coisas úteis, nobres, válidas e “de fundamento”
Eu até fico na História, amanhã, se quiserem...
Mas hoje,
Hoje me deixem voar.
 Deixem-me voar.
Ou não me deixem – porque o céu também é uma ilusão.
Não consigo e talvez não queira ler o nada que há em mim,
Por isso não expresso nada,
Não escrevo, não sonho,
Não sei de nada,
Não durmo...
Tem muita coisa neste(nesse) abismo
Que talvez esteja se preparando pra amanhã ser vulcão em erupção.
Não, não quero isso,
Quero ser mais forte.
Deixem de ser covardes e hipócritas!
Deixem-me voar.

Eu não sou uma de vocês.

Estela de Menezes, 4/12/2012, entre 4 e 4 e 34 da manhã.

*F. Pessoa

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