terça-feira, 17 de julho de 2012

Lunara

                         “Acho que parando bem embaixo dela (a lua) da pra laçar, não?!”
                                                                                       Antonio Carlos de Menezes



Não era uma paixão doentia dessas em que a gente não consegue fazer outra coisa senão pensar no ser amado, arrumar-se para ele, perfumar-se para ele, ir onde ele possa estar, fugir de onde ele possa estar; não conseguir comer, dormir, não querer nem se arrumar, nem tomar banho ou escovar os dentes se ele não estará lá para nos ver... Não, nada disso! Era um amor natural e sublime, belo com toda harmonia e encanto que só tem o que é natural e espontâneo o suficiente para ser verdadeiramente belo.
 Era assim que Marcos amava e era correspondido. Toda noite depois de ter tomado seu banho para tirar de si o peso do dia de trabalho, de ter tranquilamente se alimentado, saía com a roupa e o cheiro de quem estava de bem consigo mesmo, pegava seu cavalo e corria veloz pelo campo, girava seu laço e pah! – laçava a lua, que então sorria e a terra inteira percebia seu brilho mais iluminado.
 Marcos ia o mais para debaixo da lua possível e pela corda que usara de laço subia até ela, lá ficava horas, conversavam tranqüilos sem precisar se preocupar em organizar palavras, sem precisar forçar o pensamento, pois tudo fluía, não era preciso nem falar, pois a comunicação entre a lua e os seres humanos, como todos sabemos, é telepática.
Era assim o romance sublime do jovem e da lua, como os romances inocentes das crianças.
 De lá muitas vezes se punham os dois a olhar a terra, os campos... ao longe Marcos mostrava para a lua sua casa, seu cavalo, seus parentes, sua árvore predileta, seus amigos.
Até que um dia quando os dois se divertiam a observar o comportamento das pessoas na fila do cinema ele viu Lunara, o olhar dela era mais negro que a noite e mais brilhante que o luar, seu sorriso era um mar de estrelas e seu cabelo o próprio vento a voar e brincar vestido de cachoeira enluarada, a pele de Lunara era a terra, a terra a ser tocada, a ser sentida, descoberta, devorada.
Marcos desceu até terra e desatinado tratou de  vestir-se com a melhor roupa que encontrou no comércio, experimentou toda loja de perfumes e comprou uns vinte, cortou, hidratou o cabelo, fez a barba, comprou um carro e aprendeu umas poses de artista e umas palavras de “palestrante profissional da área da autoajuda”. Agora estava sempre preocupado em ser o mais bonito, o mais atraente, o mais inteligente, o mais interessante. Sempre procurando estar onde Lunara estivesse, um dia, como não poderia deixar de ser, se conheceram.
 Lunara deliciava-se com o ventinho suave tocando na sua pele, Marcos preocupava-se com o cabelo se estava arrumado, Lunara estava feliz com a noite, Marcos preocupado se a incomoda roupa estava bem aos olhos de Lunara, Lunara apreciava a música, Marcos pensava no que dizer, Lunara achou Marcos lindo, embora um tanto engomadinho, Marcos estava certo de que era sua oportunidade e não poderia desperdiçar, Lunara queria conhecer Marcos, conhecê-lo além da aparência. Ele a convidou para dar uma volta em seu carro importado e a levou aos lugares mais badalados da cidade, pagou a melhor comida, a melhor bebida, no outro dia mandou-lhe flores e um presente.
 Lunara ligou, agradeceu, mas nunca mais aceitou os convites de Marcos para sair.
Por  mais que  ele pense não consegue entender o que aconteceu, ele tinha se esforçado tanto!
Lunara continua esperando alguém que sente com ela na grama e assim como ela converse com a lua e não se preocupe com nada, mas viva apenas,- viva com ela um romance tranqüilo e natural como os romances inocentes das crianças.

                                                                   Estela de Menezes. 07 de julho de 2012.

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